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10.

 

Bule de Chá
Bule de porcelana da China de Encomenda.
Início do século XIX.

 

Porcelain teapot from Chinese porcelain order. It dates from the beginning of the 19th century.

 

CR268

 

Alt/H. 200mm

Larg/W. 300mm

O canto da chávena de chá

 

Poisamos as mãos junto da chávena sem saber que a porcelana e o osso são formas próximas da mesma substância. A minha mão e a chávena nacarada – se eu temperar o lirismo com a ironia – são, ainda, familiares

dos pterossáurios.

A tranquila tarde enche as vidraças. A água escorre da bica com ruído, os melros espiam-me na latada seca. É assim que muitas vezes o chá evoca: a minha mão de pedra, tarde serena, olhar dos melros, som leve da bica. A Natureza copia esta pintura do fim da tarde que para mim pintei, retribui-me os poemas que eu lhe fiz de novo dando-me os meus versos ao vivo. Como se eu merecesse esta paisagem a Natureza dá-me o que lhe dei. No entanto algures, num poema, ouvi rodarem as roldanas do cenário, em que as palavras representavam a cena da pintura

da paisagem num telão constantemente vário. Só o chá

me traz a minha tarde, com a chávena e a minha mão que são o mesmo pedaço de calcário. Hoje a bica refresca a água do tanque, os melros descem da latada para o chão, e as vidraças devagar escurecem. As palavras movem-se e repõem no seu imóvel eixo de rotação o espaço onde esta mesa de verga gira nas grandes nebulosas.

 

Autor: Fiama Hasse Pais Brandão

Fonte: Cantos do Canto, Relógio d´água Editora, 1995